Ordem dos Frades Menores Conventuais

Nossa Vida e Regra

Introdução

Damos-lhe esse nome porque foi aprovada pela bula “Solet annuere” de Honório III (1223). Nunca houve dúvidas quanto à autenticidade nem quanto ao texto desta Regra. São numerosíssimos os manuscritos medievais que a trazem, mas nem precisamos deles: temos o pergaminho original da bula, que inclui a Regra, e está guardado em Assis (com muitas fotocópias modernas espalhadas por nossos conventos). Nos arquivos do Vaticano também ficou uma cópia, com pequenas diferenças devidas a falhas dos amanuenses. É a Forma de Vida que vale deste 1223, para todos os Frades Menores e, por isso, é amplamente conhecida por todos os franciscanos, que a sabem de cor.

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Em nome do Senhor! Começa a vida dos Frades Menores

  1. A Regra e vida dos Frades Menores é esta, a saber: observar o santo Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo vivendo em obediência, sem próprio e em castidade.
  2. Frei Francisco promete obediência e reverência ao senhor papa Honório e a seus sucessores canonicamente eleitos e à Igreja Romana.
  3. E os outros frades estejam obrigados a obedecer a Frei Francisco e a seus sucessores.

Sobre os que querem receber esta vida e como devem ser recebidos

  1. Se alguns quiserem receber esta vida e vierem aos nosso frades, mandem-nos aos seus ministros provinciais, aos quais somente e não a outros se conceda a licença de receber frades.
  2. Mas os ministros examinem-nos diligentemente sobre a fé católica e os sacramentos da Igreja.
  3. E se crerem em todas essas coisas e as quiserem confessar fielmente e observar firmemente até o fim
  4. e não têm mulheres ou, se as têm, e já entraram as mulheres em um mosteiro ou lhes deram licença com autorização do bispo diocesano, emitido já o voto de continência, e que sejam as mulheres daquela idade que delas não possa originar-se suspeita,
  5. digam-lhes a palavra do santo Evangelho (cfr. Mt 19,21, par.) que vão e vendam todas suas coisas e procurem distribuí-las aos pobres.
  6. O que, se não puderem fazer, basta-lhes a boa vontade.
  7. E guardem-se os frades e seus ministros de serem solícitos por suas coisas temporais, para que façam livremente de suas coisas tudo que o Senhor lhes inspirar.
  8. Contudo, se precisar de conselho, tenham licença os ministros de enviá-los a alguns temerosos de Deus, com cujo conselho seus bens sejam dados aos pobres.
  9. Depois concedam-lhes os panos da provação, a saber, duas túnicas sem capuz e o cíngulo, e bragas e um caparão até o cíngulo,
  10. a não ser que aos mesmos ministros alguma vez pareça melhor outra coisa, segundo Deus.
  11. Mas, acabado o ano da provação, sejam recebidos na obediência, prometendo observar sempre esta vida e regra.
  12. E de nenhum modo lhes será lícito sair desta religião, conforme o mandato do senhor Papa,
  13. porque, segundo o santo Evangelho, ninguém que põe a mão no arado e olha para trás é apto para o reino de Deus (Lc 9,62).
  14. E os que já prometeram obediência tenham uma túnica com capuz e outra sem capuz, os que quiserem ter.
  15. E os que são forçados por necessidade possam levar calçado.
  16. E todos os frades vistam-se de roupas vis e possam remendá-las com sacos e outros retalhos com a bênção de Deus.
  17. Os quais admoesto e exorto a que não desprezem nem julguem os homens que virem vestidos com roupas finas e coloridas, usando comidas e bebidas delicadas, mas antes julgue e despreze cada um a si mesmo.

Do ofício divino e do jejum, e como os frades devem ir pelo mundo

  1. Os clérigos rezem o ofício divino segundo a ordenação da Igreja Romana, exceto o saltério,
  2. pelo que poderão ter breviários.
  3. Os leigos digam vinte e quatro Pai-nosso por matinas, por laudes cinco, por prima, terça, sexta, noa, por cada uma destas sete, pelas vésperas porém doze, pelas completas sete;
  4. e rezem pelos defuntos.
  5. E jejuem desde a festa de Todos os Santos até o Natal do Senhor.
  6. Mas a santa quaresma que começa na Epifania até os quarenta dias contínuos, que o Senhor consagrou por seu santo jejum (cfr. Mt 4,2), os que voluntariamente a jejuam sejam abençoados pelo Senhor, e os que não quiserem não sejam obrigados. 7 Mas jejuem a outra, até a Ressurreição do Senhor.
  7. Mas em outros tempos não tenham que jejuar, senão na sexta-feira.
  8. Mas em tempo de manifesta necessidade não estejam obrigados os frades ao jejum corporal.
  9. Aconselho, porém, admoesto e exorto meus frades no Senhor Jesus Cristo que, quando vão pelo mundo, não litiguem nem contendam com palavras (cfr. 2Tm 2,14), nem julguem os outros;
  10. mas sejam amáveis, pacíficos e modestos, mansos e humildes, falando a todos honestamente, como convém.
  11. E não devem cavalgar, senão obrigados por manifesta necessidade ou doença.
  12. Em qualquer casa em que entrem, digam primeiro: Paz a esta casa (cfr. Lc 10,5).
  13. E segundo o santo Evangelho, seja licito comer de todos os alimentos que lhes servirem (cfr. Lc 10,8).

Que os frades não recebam pecúnia

  1. Mando firmemente a todos os frades que de nenhum modo recebam dinheiro ou pecúnia por si ou por intermediário.
  2. Mas, para as necessidades dos enfermos e para vestir os outros frades, os ministros apenas e os custódios, por meio de amigos espirituais, tenham solícito cuidado, segundo os lugares e tempos e frias regiões, como lhes parecer servir à necessidade;
  3. sempre salvo, como foi dito, que não recebam dinheiro ou pecúnia.

Do modo de trabalhar

  1. Os frades a quem o Senhor deu a graça de trabalhar, trabalhem fiel e devotamente,
  2. de modo que, afastando o ócio inimigo da alma, não extingam o espírito da santa oração e devoção, ao qual as outras coisas temporais devem servir.
  3. Como mercê do trabalho recebam para si e seus irmãos o necessário para o corpo, menos dinheiro ou pecúnia, e isso humildemente,
  4. como convém a servos de Deus e seguidores da santíssima pobreza.

Que de nada se apropriem os frades, do pedir esmolas e dos frades enfermos

  1. Os frades de nada se apropriem, nem casa, nem lugar, nem coisa alguma.
  2. E como peregrinos e forasteiros (cfr. 1Pd 2,11) neste século, servindo ao Senhor em pobreza e humildade, vão por esmola confiadamente,
  3. e não devem envergonhar-se, porque o Senhor se fez pobre por nós neste mundo (cfr. 2Cor 8,9).
  4. Esta é aquela eminência da altíssima pobreza que vos constituiu, caríssimos irmãos meus, herdeiros e reis do reino dos céus, vos fez pobres de coisas e sublimou em virtudes (cfr. Tg 2,5).
  5. Seja esta a vossa porção, que leva à terra dos viventes (cfr. Sl 141,6). 6 À qual, prendendo-vos totalmente, nada mais queirais possuir para sempre embaixo do céu, pelo nome de nosso Senhor Jesus Cristo.
  6. E, onde quer que estejam e se encontrarem os frades, mostrem-se familiares mutuamente entre si.
  7. E com segurança manifeste um ao outro sua necessidade, porque, se a mãe ama e nutre o seu filho (cfr. 1Ts 2,7) carnal, quanto mais diligentemente deve cada um amar e nutrir seu irmão espiritual?
  8. E se algum deles cair na doença, os outros frades devem servi-lo como queriam ser servidos (cfr. Mt 7,12).

Da penitência a impor-se aos frades que pecam

  1. Se alguns dos frades, instigando o inimigo, pecarem mortalmente, naqueles pecados dos quais foi ordenado entre os frades que se recorra só aos ministros provinciais, tenham os preditos frades que recorrer a eles, o mais depressa que puderem, sem demora.
  2. Os próprios ministros, se são presbíteros, imponham-lhes penitência com misericórdia; mas, se não forem presbíteros, façam que se lhes imponha por outros sacerdotes da Ordem, como lhes parecer melhor segundo Deus.
  3. E devem cuidar de não se irar nem perturbar pelo pecado de alguém, porque a ira e a conturbação impedem a caridade em si e nos outros.

Da eleição do ministro geral desta fraternidade e do capítulo de Pentecostes

  1. Todos os frades sejam sempre obrigados a ter um ministro geral e servo de toda a fraternidade e tenham que obedecer-lhe firmemente.
  2. Quando ele falecer, faça-se a eleição do sucessor pelos ministros provinciais e custódios no capítulo de Pentecostes, em que os ministros provinciais tenham sempre que se reunir juntos, onde quer que for estabelecido pelo ministro geral;
  3. e isso uma vez cada três anos ou em outro termo maior ou menor, como for mandado pelo predito ministro.
  4. E se em algum tempo parecer à totalidade dos ministros provinciais e dos custódios que o predito ministro não é suficiente para o serviço e a utilidade comum dos frades, tenham os preditos frades, aos quais foi dada a eleição, em nome do Senhor, a eleger outro para seu custódio.
  5. Mas depois do capítulo de Pentecostes possa cada um dos ministros e custódios, se quiserem e lhes parecer oportuno, convocar uma vez seus frades a capítulo, no mesmo ano e em suas custódias.

Dos pregadores

  1. Os frades não preguem na diocese de um bispo quando lhes for proibido por ele.
  2. E nenhum dos frades se atreva absolutamente a pregar ao povo, se não tiver sido examinado e aprovado pelo ministro geral desta fraternidade, e por ele lhe tiver sido concedido o ofício da pregação.
  3. Admoesto também e exorto os mesmos frades a que, na pregação que fazem, sejam examinadas e castas suas palavras (cfr. Sal 11,7; 17,31), para a utilidade e edificação do povo,
  4. anunciando-lhes os vícios e as virtudes, a pena e a glória, com brevidade de sermão; porque palavra abreviada fez o Senhor sobre a terra (cfr. Rm 9,28).

Da admoestação e correção dos frades

  1. Os frades que são ministros e servos dos outros frades visitem e admoestem seus frades e os corrijam humilde e caridosamente, não lhes prescrevendo o que for contra sua alma e nossa regra.
  2. Mas os frades que são súditos lembrem que por Deus negaram suas próprias vontades.
  3. Por isso lhes prescrevo firmemente que obedeçam a seus ministros em tudo que prometeram ao Senhor observar e que não é contrário a sua alma e à nossa regra.
  4. E onde houver frades que saibam e conheçam que não podem observar a regra espiritualmente, devam e possam recorrer a seus ministros.
  5. Mas os ministros os recebam caritativa e benignamente e tenham tanta familiaridade com eles que possam falar-lhes e agir como senhores com seus servos;
  6. pois assim deve ser, que os ministros sejam servos de todos os frades.
  7. Mas admoesto e exorto no Senhor Jesus Cristo que se guardem os frades de toda soberba, vanglória, inveja, avareza (cfr. Lc 12,15), cuidado e solicitude deste século (cfr. Mt 13,22), detração e murmuração, e não cuidem os que não sabem letras de aprender letras;
  8. mas atendam a que sobre todas as coisas devem desejar ter o Espírito do Senhor e sua santa operação,
  9. orar sempre a ele de coração puro e ter humildade, paciência na perseguição e na enfermidade
  10. e amar os que nos perseguem e repreendem e acusam, porque diz o Senhor: Amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem e caluniam (cfr. Mt 5,44).
  11. Bem-aventurados os que sofrem perseguição pela justiça, porque deles é o reino dos céus (Mt 5,10).
  12. Mas o que perseverar até o fim, esse será salvo (Mt 10,22).

Que os frades não entrem nos mosteiros de monjas

  1. Mando firmemente a todos os frades não tenham relações suspeitas ou conselhos de mulheres,
  2. e não entrem nos mosteiros de monjas, fora aqueles a quem se concedeu licença especial pela sé apostólica;
  3. nem se façam compadres de homens ou mulheres para que, nessa ocasião, não se origine escândalo entre os frades ou sobre os frades.

Dos que vão entre os sarracenos e outros infiéis

  1. Qualquer dos frades que, por divina inspiração, quiser ir entre os sarracenos e outros infiéis, peçam daí licença a seus ministros provinciais.
  2. Mas os ministros a nenhum concedam licença de ir senão aos que virem ser idôneos para enviar.
  3. Para isso imponho por obediência aos ministros que peçam ao senhor papa um dos cardeais da santa Igreja Romana que seja governador, protetor e corretor desta fraternidade,
  4. para que sempre súditos e sujeitos aos pés da mesma santa Igreja, estáveis na fé (cfr. 1Col 1,23) católica, observemos a pobreza e humildade e o santo evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo, que prometemos firmemente.