Ordem dos Frades Menores Conventuais

Gotas de Franciscanismo – A oração

Imagem de Robert Cheaib por Pixabay

Paz e bem! Bem vindos irmãos e irmãs a mais um momento de reflexão com o nosso Programa Gotas de Franciscanismo. Hoje vamos falar de um tema muito importante para São Francisco de Assis e para todos os cristãos: A oração! O que São Francisco pode nos ensinar sobre a Oração? O que compreende São Francisco sobre a oração e como deve rezar o frade menor? No Capítulo III da Regra Bulada, São Francisco em unidade com toda a Igreja apresenta como deve será oração do frade menor: “Os clérigos rezem o ofício divino segundo a ordenação da Igreja Romana, exceto o saltério, pelo que poderão ter breviários. Os leigos digam vinte e quatro Pai-nosso por matinas, por laudes cinco, por prima, terça, sexta, noa, por cada uma destas sete, pelas vésperas porém doze, pelas completas sete; e rezem pelos defuntos.” São Boaventura ao comentar a Regra Franciscana vai dizer que São Francisco compreende que não há oração maior do que aquela que é rezada pela própria Igreja.  Por isso, aos frades é confiada a oração do Breviário como assim reza a Santa Igreja. Mesmo sendo uma oração muito longa, São Francisco não abrevia a oração por causa da necessidade ministerial. Sabe muito bem São Francisco das necessidades dos homens, mas não diminui o tempo de oração no qual os confrades proclamam com os lábios e o coração os louvores divinos.[1] Pela oração da liturgia das horas, em unidade com a Santa Igreja, os frades participam da missão salvífica e adoradora da Igreja que canta incessantemente o cântico de louvor trazido por Cristo a cada um de nós. Porém, a Ordem Franciscana participa deste louvor de modo próprio através de seu carisma marcado pela fraternidade e pela missão itinerante. A oração do frade menor se estabelece não apenas no âmbito particular, mas na comunidade. A fraternidade, como apresenta São Francisco na Regra, é fraternidade cultual e apostólica. É a comunidade que reza junto e que também juntos evangelizam.[2] Deste modo, Frei Dorvalino vai dizer “que a oração é o primeiro e mais importante de todos os trabalhos do frade menor.” [3] Pela oração o frade menor busca louvar a Deus de todo o coração e afastar de seu coração toda possibilidade de egocentrismo e piedade centrada na subjetividade.[4] É Jesus Cristo nosso Mestre de oração e aquele que nos ensina como devemos rezar. Quando chamamos a Deus de Pai nos abrimos à confiança no Deus que nos acolhe como filhos e no qual sua afeição se estende a todos os homens e mulheres. Voltados para o céu compreendemos que devemos buscar as coisas do Alto com os pés na terra. E que o cotidiano de nossas vidas seja marcado pelo compromisso de santificar e bendizer ao Criador de todas as coisas através de um trabalho honesto e responsável, do perdão sem medida e livres de tudo aquilo que venha nos tirar do caminho da vida. A oração se traduz em vida quando nos tornamos testemunhas do bem que amamos e desejamos, e que possam ser desejados e amados por todos: “Seja feita a tua vontade assim na terra como no céu”.[5]

            Pela oração o frade menor experimenta o agir do Espírito Santo que nele reza e suplica ao Pai com gemidos inefáveis. A abertura a Deus faz o homem experimentar o nascer em seu interior do Novo Homem que uni seu querer ao querer do Criador. É o testemunho exemplar do Fiat de Maria, do “Senhor, que queres que eu faça” de São Francisco e do “Fala Senhor que teu servo escuta” de Samuel. A oração está longe de intimismo ou de um fazer nosso. São Francisco compreende a oração com um trabalho artesanal para entrar na dinâmica divina de colocar-se na vida.  Aquele que uni-se a Cristo e eleva ao Pai um louvor proclama sobre o mundo a vontade divina desde a criação do mundo.[6] Orar é proclamar a certeza do projeto divino sobre toda a realidade criada nos apresentada por Cristo.[7] Em Cristo descobrimos que fomos escolhidos, abençoados, predestinados a sermos conformes a sua imagem. E isto é possível pela sua oferta de amor na Cruz no qual recebemos como dom o Espírito Santo, o Paráclito. É Cristo que nos ensina a rezar ao Pai e nos transfigura em Novos Homens pelo seu infinito amor. Quanto mais rezamos e repetimos, mais adentramos no misterioso, profundo e generoso coração de Deus e descobrimos a gratuidade da vocação recebida. A oração nos lança sempre para o ponto de partida de toda caminhada de fé. Por isso, São Francisco andava sempre, alegre e jubiloso, cantando os louvores do Criador.[8] De Deus é que provém todos os bens que só pela oração é possível reconhecer:

E devolvamos todos os bens ao Senhor Deus Altíssimo e sumo e reconheçamos que todos os bens são dele e demos graças por tudo a ele, de quem todos os bens procedem. E o mesmo altíssimo e sumo, o único verdadeiro Deus tenha e lhe sejam tributadas todas as honras e reverências, todos os louvores e bênçãos, todas as graças e glória, de quem é todo bem, o único que é bom (cfr. Lc 18,19). E quando vemos ou ouvimos dizer ou fazer o mal ou blasfemar a Deus, nós bendigamos e façamos o bem, e louvemos a Deus (cfr. Rm 12,21), que é bendito pelos séculos (Rm 1,25).[9]

Quem nos faz olhar assim as coisas ao nosso redor e dar glórias ao Pai é Jesus Cristo. Em Jesus descobrimos que tudo foi criado por amor ao homem no qual sua encarnação é manifestação máxima daquilo que Deus já tinha preparado para nós. A encarnação de Jesus é mistério de amor que toca as nossas realidades e nos abre para ver em toda obra criada os vestígios do Criador e torna possível nossa oração de louvor[10].

Aprendemos com São Francisco a importância da oração e o quanto devemos rezar sempre ao Senhor para permanecermos firmes em seus caminhos. A oração é abertura ao Dom do Pai que é Cristo, o Senhor. Foi Jesus inaugurou entre nós o hino de louvor cantado na mansão celeste. Agora numa relação de crescente configuração a Cristo nos unimos a Ele para cantar eternamente ao Pai nosso louvor. Irmãos e irmãs, trabalhemos arduamente para que nossa oração se torne um compromisso concreto, relação de proximidade e de encontro com Deus e com os irmãos. Que nossas orações possam ultrapassar qualquer tipo de intimismo, de egocentrismo ou fechamento em si. Oração é abertura ao Espírito Santo e é o mais importante de todos os trabalhos que o frade pode realizar. Pois é na oração que é possível conhecer o coração de Deus e se abrir para acolher tão grande mistério que atravessa o ser humano. Tão profunda deve ser nossa oração que nossas atividades devem estar permeadas pela mesma presença e disponibilidade que nos colocamos para rezar. A oração constante nos aponta que mesmo nos momentos de descanso, o compromisso com o seguimento de Jesus nunca para e descansa.  A oração não nos deixa esquecer o motivo pelo qual realizamos muitas coisas ao longo de nosso dia e nos livra do superficialismo com que nos colocamos a trabalhar.[11] É Cristo o centro e o motivo do qual nasce toda vocação e missão. Para concluir gostaria de partilhar com vocês um trecho do Ofício de Leituras de São João Maria Vianney:

“Prestai atenção, meus filhinhos: o tesouro do cristão não está na terra, mas nos céus. Por isso, o nosso pensamento deve estar voltado para onde está o nosso tesouro. Esta é a mais bela profissão do homem: rezar e amar. Se rezais e amais, eis aí a felicidade do homem sobre a terra. A oração nada mais é do que a união com Deus. Quando alguém tem o coração puro e unido a Deus, sente em si mesmo uma suavidade e doçura que inebria, e uma luz maravilhosa que o envolve. Nesta íntima união, Deus e a alma são como dois pedaços de cera, fundidos num só, de tal modo que ninguém pode mais separar. Como é bela esta união de Deus com sua pequenina criatura! É uma felicidade impossível de se compreender. Nós nos havíamos tornado indignos de rezar. Deus, porém, na sua bondade, permitiu-nos falar com ele. Nossa oração é o incenso que mais lhe agrada. Meus filhinhos, o vosso coração é por demais pequeno, mas a oração o dilata e torna capaz de amar a Deus. A oração faz saborear antecipadamente a felicidade do céu; é como o mel que se derrama sobre a alma e faz com que tudo nos seja doce. Na oração bem feita, os sofrimentos desaparecem, como a neve que se derrete sob os raios do sol.”


[1] BOAVENTURA, S. Exposição sobre a Regra dos Frades Menores. Tradução de Frei Plácido Robaert, OFM e Frei Dorvalino Fassini, OFM. Evangraf, 2008. Pag. 56.

[2] CONTI, Martinho. Leitua Bíblica da Regra Franciscana. Editora Vozes/CEFEPAL, 1983. Pg. 174-179.

[3] FASSINI, Frei Dorvalino Francisco, OFM. Vida e Regra Franciscana: Estranhando sua primeira versão vinda até nós, 2005. Pag.117.

[4] Idem.

[5] BOAVENTURA, S. Exposição sobre a Regra dos Frades Menores. Tradução de Frei Plácido Robaert, OFM e Frei Dorvalino Fassini, OFM. Evangraf, 2008. Pag. 57.

[6] FASSINI, Frei Dorvalino Francisco, OFM. Vida e Regra Franciscana: Estranhando sua primeira versão vinda até nós, 2005. Pag.123-124.

[7] Cf. Ef. 1,9.

[8] HUBAULT, Michel. Caminhos de interioridade com São Francisco de Assis. Editorial Franciscana, 2012. Pag. 164.

[9] RNB 17, 17-19.

[10] HUBAULT, Michel. Caminhos de interioridade com São Francisco de Assis. Editorial Franciscana, 2012. Pag. 167-169.

[11] FASSINI, Frei Dorvalino Francisco,OFM. Vida Consagrada e Formação. 2002. Pg. 88-93.

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