Ordem dos Frades Menores Conventuais

Artigos, Destaques, Formação › 08/11/2022

Espiritualidade Franciscana para os dias atuais

Imagem de Gordon Johnson por Pixabay

São Francisco de Assis se identificou tanto com Jesus Cristo que após sua morte, muitos
começaram a dizer, ele nem é apenas um santo, mas um outro Cristo. Para entendermos um
pouco isso, precisamos recordar que para Francisco, Deus é o Bem, o Sumo Bem, o Altíssimo e
Onipotente Bom Senhor, e fora Dele, não existe outro Bem. Em nossa vida, todos os bens e
virtudes provém do Altíssimo e Sumo Bem.
Desde sua infância, São Francisco se encantou com as coisas bonitas e boas. Devagar, foi
descobrindo que por trás de tanta coisa bonita e boa, devia haver, um Bem Infinito. De uma
certa maneira, podemos dizer que sua religiosidade e espiritualidade, está baseada nesse
ponto, eu quero ver Deus. Mas, iluminado pelo Evangelho, Francisco sabia que ver o Pai é
impossível, pois Ele habita em uma altitude inacessível. Contudo, Francisco entendeu, através
do Evangelho, que aquele que vê Jesus, vê o Pai. Logo, podemos afirmar que São Francisco
descobre o Evangelho e vai se apaixonando pela pessoa de Jesus Cristo e foi percebendo esse
Bem enorme que vinha do Infinito e devagar, foi sublinhando alguns aspectos. Sendo assim, foi
colocando para seus seguidores, os penitentes de Assis, que o mais importante nessa vida é
seguir Jesus crucificado e pobre.
Para nós homens de hoje, pode dar uma impressão negativa, que crucificado é um sofredor,
é alguém condenado como um criminoso, e pobre é alguém que não tem o suficiente apenas.
Pelo contrário, São Francisco entende que Deus é o Sumo Bem, Deus é o Amor que não é
Amado. Sendo assim, Jesus nosso Irmão e Mestre, se esvaziou, assumindo a condição de
Servo. Deus se humaniza, para que o ser humano seja Divinizado. Vemos assim, Jesus do
presépio de Greccio.
Esse mesmo Jesus, esvaziou-se uma outra vez, e de maneira plena, quando se entregou na
cruz, por amor a cada um de nós e para nossa salvação. Muitas vezes, nos damos mal na vida,
porque nos enchemos de si mesmos e de maneira prepotente, não tratamos o outro, que é o
nosso irmão e irmã, com cortesia e amorosidade. E na medida que nos esvaziamos é que
podemos acolher, o Bem, todo Bem, o Sumo Bem, esse Jesus da Encarnação no ventre
imaculado de Maria, e esse Jesus da Cruz, das cruzes que carregamos a cada dia.
Podemos olhar ainda, para um outro aspecto, esse amor de Jesus é tão grande que, quando
Ele se entrega, não sobra nada, esse é o Amor da Santíssima Trindade. Aos poucos São
Francisco foi traçando uma espiritualidade em três grandes pontos: o Jesus do Presépio, da
Cruz e Eucarístico. Ao considerarmos esse aspecto, vemos que Jesus não tinha nem onde
nascer, nem roupa para vestir, pois foi aquecido pela presença dos animais, e São Francisco vai
considerar, que Jesus foi tão amoroso, ficou tão vazio, que não possuía nada, assim como na
Cruz e na Eucaristia. Dessa forma, São Francisco considerou e ensinou, que na Eucaristia, Jesus
se esvaziou e se esvazia em todos os altares. Pois sempre que é celebrada a Eucaristia, Jesus se
faz pão do Céu, e entrega a Si mesmo, de maneira plena: Este é o meu Corpo, Este é o meu
sangue que é entregue por vós.
Ora, sabemos que em cada Santa Missa, seja em uma majestosa Catedral, seja na
comunidade mais simples, podemos adorar o Rei dos Reis, o Senhor dos Senhores,
como todo amor e devoção. Muitas vezes, não damos a Jesus a verdadeira reverência
e na prática, infelizmente, tratamos a Eucaristia, Corpo e Sangue do Senhor, como
queremos e como bem entendemos.
Então, vemos e entendemos ainda mais, a grandeza desse Sacramento e da
Espiritualidade Franciscana. Porque para o Pobrezinho de Assis, Jesus não manda

em quem comunga ou em quem o recebe, simplesmente se faz pobre, em cada
Eucaristia, e está nu, pobre, ao nosso dispor. Francisco de Assis alimentava uma
profunda fé nas palavras do Cristo: “Eu sou o pão vivo descido do céu.” Quem comer deste pão
tem a vida eterna” (João 6,51a). “… E eu o ressuscitarei no último dia” (João 6,54b). Na
Eucaristia buscava a força, a vitalidade e o vigor para a dimensão espiritual, fraterna e vivencial
de sua fé. Dessa maneira, São Francisco nos ensina, aquela reverência, própria da sua
Espiritualidade Eclesial e Católica: “Pasme o homem todo, estremeça a terra inteira,
rejubile o céu em altas vozes quando, sobre o altar, estiver nas mãos do sacerdote o Cristo,
Filho de Deus vivo! Ó grandeza maravilhosa, ó admirável condescendência! Ó humildade
sublime, ó humilde sublimidade! O Senhor do universo, Deus e Filho de Deus, se humilha a
ponto de se esconder, para nosso bem, na modesta aparência de pão … Nada de vós retenhais
para vós mesmos, para que totalmente vos receba quem totalmente se vos dá” (Carta de São
Francisco à Ordem).
Este amor à Eucaristia é parte integrante de seu processo de conversão, como ele mesmo o
afirma: “Então o Senhor me deu uma tão grande fé” (Testamento 4). Este “então” significa
depois de servir os leprosos, depois de abandonar o mundo, depois de fazer a ruptura com o
pai. “Então”, vai estabelecer-se na igrejinha de São Damião, onde trabalhou por dois anos.
Aqui conviveu com o capelão que, diariamente celebrava a Santa Missa. Por vezes repetia:
“Nós vos adoramos, Santíssimo Senhor Jesus Cristo, aqui e em todas as vossas igrejas que
estão no mundo inteiro e vos bendizemos, porque pela vossa santa Cruz remistes o mundo”
(Testamento 5). Percebemos que a Espiritualidade Franciscana vai sendo desenvolvida, na
Pessoa de Jesus Cristo, nas dimensões citadas, como um Jesus, que veio, que vem e que virá,
por amor de nós. Tudo isso é possível, através do poder, não o poder do mundo e de sua
mentalidade opressora e gananciosa, mais com o poder do serviço, de um verdadeiro lava-pés.
Este aspecto, é uma outra dimensão da Espiritualidade franciscana, o poder de servir os irmãos
e irmãs. Na quinta-feira Santa, Jesus lava os pés dos discípulos. E durante sua vida Francisco de
Assis, bem devagar, foi se tornando aquele que é o esplendor da Verdade, a substância da
Glória Divina, um outro Cristo.
Em suma, a Espiritualidade Franciscana, nos leva a viver em nossos dias atuais a mística da
dimensão da fé cristã: a Encarnação (o Presépio) a Cruz e a Eucaristia. O Presépio lembra-nos
do ser pequenino, menor. A cruz lembra-nos do aniquilamento (ter um coração
desapropriado) e do abandono à vontade do Pai, que é o Nosso Sumo Bem. E a Eucaristia
lembra-nos da vida, do sustento, da humildade e o silêncio que santifica.


Daniel Silbernagel, OFS – Fraternidade de Nossa Senhora dos Anjos.

Referências Bibliográficas:


1 – Concílio Vaticano II, Constituição “Sacrosanctum Concilium” sobre a Liturgia, n. 07
2 – FONTES Franciscanas e Clarianas. C.M. Teixeira.Petrópolis: Vozes, 2004.
3 – LEHMANN, L. Francisco: Mestre de oração. Piracicaba: Centro Franciscano de
Espiritualidade, 1997.

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