Ordem dos Frades Menores Conventuais

Artigos, Destaques › 01/09/2019

A bíblia como fruto da identidade de um Povo que se autocompreende como “Povo de Deus”.

A Bíblia reivindica para si a autoria divina, por isso é absolutamente importante aprofundar o papel da atividade de Deus em seu processo de composição humano e institucional.

É bom lembrar que a Bíblia pode ser entendida como uma “biblioteca”, (um conjunto de vários livros), e cada livro ai contido não foi obra de um único autor individual, «assim, vemos a Bíblia crescendo quando o povo Cresce, mudando com as mudanças sociais do povo e se tornando padronizada à medida que o povo busca estabilidade, ver as Escrituras a partir dessa perspectiva deve ajudar o leitor a valorizar a descrição da Bíblia como ‘a palavra de Deus em palavras humanas”.

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Aqui entramos no tema da Inspiração da Bíblia: Nos últimos anos vimos várias tentativas de solucionar o dilema da autoria dual (divina e humana) e as forças e fraquezas de cada uma das soluções apresentadas pelos estudiosos. Embora esta seja uma questão muito importante ao ponto de não ser menosprezada, o significado do texto é, em última análise, a questão mais importante. A bíblia adquire relevância e significado a partir da Fé do Povo de Israel em um Deus que o elegeu seu Povo, por conseguinte: ‘Povo de Deus’.

A expressão “Povo de Deus” serve de exemplo. Nossos antepassados religiosos acreditavam que constituíam “o Povo de Deus”, e esse conceito não só os identificou, mas também modelou o caminho que seguiram através da história e lhes explicou a razão de continuarem a sobreviver. Para eles, ser “o Povo de Deus” significava que Deus os chamara, conduzia e os protegia. Tal fé foi vivida, custodiada e passada de geração em geração em forma de tradições primeiramente orais e paulatinamente escritas.

Contudo, Tradições ligeiramente divergentes e, às vezes, até muito diferentes poderiam surgir e coexistirem, na verdade surgiram. Exemplos de tal diversidade incluem os dois relatos da Criação (Gn 1,1-2,4a, e Gn 2,4b-25) e os vários relatos da conversão de Paulo (Gl 1,13-17, At 9, 1-9; 22,6-11; 26,12-18). Tradições diferentes não causavam necessariamente tensões indevidas dentro da comunidade, desde que a identidade do povo não fosse ameaçada, um exemplo evidente disto, é a coexistência das quatro tradições evangélicas (Mateus, Marcos, Lucas e João), compreendidas como um único Evangelho em quatro formas diversas.

Os estudiosos concordam que nem todas as Tradições sagradas do antigo Israel e/ ou do Cristianismo primitivo foram conservadas. Entre as que foram, nem todas gozam do mesmo grau de autoridade. “Em sentido bastante real, a autoridade bíblica está presente na interação entre uma tradição autêntica e a comunidade viva que a interpreta”[i]. Aqui se explica os vários Cânones da Sagrada Escritura, deste o Hebraico até as várias Composições cristãs. Para o Cristianismo, o Novo Testamento possui uma excelência com relação ao Antigo Testamento e dentro do Novo Testamento, os Evangelhos com relação aos outros livros neo-testamentários;

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A palavra de Deus, que é virtude de Deus para a salvação de todos os crentes (cfr. Rom. 1,16), apresenta-se e manifesta o seu poder de um modo eminente nos escritos do Novo Testamento. […]. Ninguém ignora que entre todas as Escrituras, mesmo do Novo Testamento, os Evangelhos têm o primeiro lugar, enquanto são o principal testemunho da vida e doutrina do Verbo encarnado, nosso salvador. […]. Com efeito, aquelas coisas que os Apóstolos, por ordem de Cristo, pregaram, foram depois, por inspiração do Espírito Santo, transmitidas por escrito por eles mesmos e por varões apostólicos como fundamento da fé, ou seja, o Evangelho quadriforme, segundo Mateus, Marcos, Lucas e João.

O cânon, então, tem a ver com a autoridade de quem, por primeiro, fez a experiência da revelação de Deus. É uma afirmação do passado que continua a ser atuante no presente. Como literatura, é uma coleção dos escritos religiosos formativos da comunidade. Os fiéis creem que esses escritos tiveram suas origens na revelação e que, como memória histórica, continuam hoje a ser fonte da revelação. «A Igreja venerou sempre as divinas Escrituras como venera o próprio Corpo do Senhor, […]. Sempre as considerou, e continua a considerar, juntamente com a sagrada Tradição, como regra suprema da sua fé».

Hoje como ontem, a fé de modo geral está ameaçada pelo risco do intimismo e da privatização da experiência religiosa. Isso ameaça não só a identidade da fé, mas também sua credibilidade diante do mundo; haja visto, os grandes conflitos existentes no mundo frutos de uma estreita visão religiosa.

Por tanto, a grande exigência da fé Cristã, antes de enunciar corretamente seus conteúdos e conceitos, é levar a cabo uma práxis vital orientada radicalmente em Cristo e à construção do Seu Reino no meio do mundo. O que só será possível a partir de um autêntico e perseverante estudo dos textos Sagrados. Para isto,

É preciso que os fiéis tenham acesso patente à Sagrada Escritura. Por esta razão, a Igreja logo desde os seus começos fez sua aquela tradução grega antiquíssima do Antigo Testamento chamada dos Setenta; e sempre tem em grande apreço as outras traduções, quer orientais quer latinas, sobretudo a chamada Vulgata. Mas, visto que a palavra de Deus deve estar sempre acessível a todos, a Igreja procura com solicitude maternal que se façam traduções aptas e fiéis nas várias línguas, sobretudo a partir dos textos originais dos livros sagrados.

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Como se pode ver a Ciência Bíblica e sua Interpretação está em continuo avanço. Contudo, a práxis (a vivência da fé) é uma dimensão constitutiva da fé Cristã que deve estar em primeiro plano. A fé em Cristo corretamente enunciada deve estar unida fundamentalmente com a fé corretamente praticada e levada a cabo no meio da história e da sociedade. Os frutos desta devem se fazer sentir no meio da realidade no sentido de produzir uma vida melhor para o homem todo e todos os homens; com influxo claro e direto no meio ambiente e em todo o Mundo, como nos ensina o Magistério do Papa Francisco com a Carta Encíclica Laudato Si’, Sobre o Cuidado da Casa Comum.

Frei Ronaldo Gomes da Silva, OFMConv.

CUSTÓDIO PROVINCIAL

Notas: 1. São Jerônimo. No ano 382, Pe. Jerônimo foi chamado pelo papa Dâmaso para ser seu secretário particular. Já em Roma, recebeu a incumbência de traduzir a Bíblia do grego e do hebraico, para o latim. Neste trabalho, ele dedicou quase toda sua vida. O conjunto final de sua tradução da Bíblia, em latim, se chamou “Vulgata” e se tornou oficial no Concílio de Trento. Desde 1947, já se celebrava o Dia da Bíblia em 30/09, data de falecimento do santo; em: salvatorianos.org.br/por-que-setembro-e-o-mes-da-biblia/.
  1. D. Bergant, CSA; Robert J. Karris, OFM (Organizadores), Comentário Bíblico (Volume I), Loyola, São Paulo, 1999, (Original: The Collegeville Bible Commentary, 1989 by The Order of St. Benedict, Inc. The Liturgical Press Collegeville, Minnesota), 13.
  2. Cf. D. Bergant, CSA; Robert J. Karris, OFM (Organizadores), Comentário Bíblico (Volume I), 15.
  3. Idem, 15.
5.Constituição Dogmática Dei Verbum. Concílio Vat. II, nº 17-18; em: http://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat-ii_const_19651118_dei-verbum_po.html.
6.D. Bergant, CSA; Robert J. Karris, OFM (Organizadores), Comentário Bíblico (Volume I), 16.
  1. Dei Verbum, nº 21.
  2. Ibidem, nº 22.
9.Cf. G. Gardaropoli, Evangelicità, Evangelizzazione, in E. Caroli, G. Zoppetti, F. Olgiati, P. Bertinato, S. Cattazzo, P. Bogon, C. Fillarini, DICIONÁRIO FRANCISCANO, Messaggero di S. Antonio, Padova, 1983, 549-572.
  1. Gardaropoli, Evangelicità, Evangelizzazione, 554.
  2. Cf. Ibidem, 2141.

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